Shugo Izumi é ceramista desde 1978. Começou seu aprendizado com Toshiyuki Ukeseki, em Cunha-SP. Seu atelier fica em Atibaia, onde também trabalha seu filho Rafael, um grande ceramista por seus próprios méritos e os ajudantes Toninho e Anderson. . Me senti em estado meditativo enquanto estava lá. Só aquilo, ali, naquela hora existia. É muito leve e prazeroso. Mestre Izumi aperfeiçoou sua técnica a tal ponto que pouquíssimas palavras são trocadas entre ele e sua equipe. Ele me ensinou que a perfeição só pode levar à simplicidade, à eliminação completa de excessos. Obrigado Izumisan.
Read MoreO Zen de Kamori
No começo de fevereiro, enquanto pesquisava personagens para a série Mestres de São Paulo, ví um post no instagram da artista Mana Bernardes sobre a alegria de ter encontrado no trabalho de Kamori o papel perfeito para sua poesia manuscrita.
Liguei para ele esperando ter que lidar com a desconfiança / timidez que quase sempre encontro no primeiro contato com os personagens desse trabalho. Essa ia ser a primeira de algumas vezes que Kamori me presenteava com uma surpresa agradável e um sorriso. Marcamos para quinta às duas.
Nessa primeira conversa falamos rapidamente por mais de três horas.
Estava diante de um mestre. Explico. O mestre se conhece tanto quanto ao seu trabalho. Sabe que seu trabalho só melhora quando ele melhora. É tão implacável nessa busca egoísta que não tem tempo para as distrações do ego. Domina o tempo do corpo e do ofício.
Vou logo deixando claro que durante as 5 horas de áudio gravado com Kamori em seu atelier na Saúde, em nenhum momento ele mencionou o termo ‘zen’. Eu assumo toda a responsabilidade por esse clichê.
Se a pessoa é a soma de suas experiências, Kamori é um gigante. A lista de suas ocupações passadas é grande. Já foi consertador de caneta, militar, agricultor, contabilista, artesão em madeira e, há uns mais de 30 anos é artista plástico e papeleiro.
Na nossa segunda conversa falamos de tudo: música, tecnologia, educação, família, exercícios físicos, agricultura, a cidade, a colônia japonesa, arte, física quântica e também de papel. Tudo isso forma O Zen de Kamori.
Fabricar papel é uma atividade braçal, repetitiva e molhada. É preciso preparo. Para uma encomenda de mil folhas é preciso repetir o processo mil vezes. E Kamori me diz que seu preparo vem sendo feito há 15 anos no Parque do Ibirapuera. Tem um método e vai praticá-lo todas terças, quintas e sábados nos aparelhos da pista de corrida, às 9.
Fui lá e aprendi parte do método que é tão simples quanto belo e eficiente. Comece com pouco esforço nas argolas (aparelho muito completo segundo ele) dependurando seu corpo e tentando completar três círculos em pêndulo, com os pés no chão. Tente por três vezes subir nas argolas. Se for como eu não vai conseguir, mas isso não importa, afinal você está começando a ensinar seus músculos. Depois dê três pulos com os pés juntos em um degrau com mais ou menos trinta centímetros de altura. Então corra um pouco. Tente se erguer três vezes na barra. Faça três flexões. Alongue-se bastante antes e depois. Pronto, você não vai sair forte nem doído. Só um pouco mais feliz. Depois de três meses aumente um pouco os exercícios. Segundo Kamori, seu corpo vai pedir mais carga naturalmente. Agora imaginem o que ele é capaz de fazer depois de quinze anos. Vai lá conversar com ele.
Para o mesmo dia à tarde marcamos as fotos no atelier. E o resultado é esse que você vê acima. Obrigado Kamori.
Vai Lá
Além de fazer papéis nas mais diferentes gramaturas de algodão, kozo, flores, bananeira e outros materiais, Kamori ministra cursos em seu atelier.
Mais informações:
www.kamoriarte.com.br
Mestres de São Paulo - Trisca e as Orquídeas
Conheci o Trisca no ano 2000 quando a Vera Maria Severo, da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo me chamou para fotografar flores nativas da Mata Atlântica. Foi um projeto lindo que me mostrou que boa parte das árvores que florescem na cidade são nativas das nossas matas. Os Ipês, as Sibipirunas, as Tipuanas e todas as majestosas árvores que enchem os olhos foram uma descoberta. Mas, um dia, esse trabalho me mandou para o Orquidário do Jardim Botânico de São Paulo.
Até então não imaginava que essas maravilhas eram nossas. A beleza delicada das orquídeas sempre me lembrou o Oriente e vivia feliz achando que todas vinham da China para enfeitar o jardim da minha tia Graziela. Também nunca soube que dentro do Jardim Botânico existia esse imenso Orquidário. Bom, sou fotógrafo, não orquidófilo, mas eu aposto que nem todos os orquidófilos conhecem esse arquivo vivo com mais de 27000 orquídeas, a maioria nativas da Mata Atlântica. E lá, no meio desses gigantescos corredores (sério, dá uma olhada nas fotos aí em cima), trabalhava o Trisca.
Trisca selecionou as orquídeas, contou sobre elas e com seu arsenal infinito de piadas fez a manhã passar rápido.
Os filmes (!) foram revelados, os contatos escolhidos, as fotos ampliadas e mais ou menos uma semana depois (era um processo demorado crianças) o trabalho foi entregue, o cliente ficou feliz e eu fui tocar minha carreira por esse mundão.
Até que, 16 anos depois, comecei a idealizar os Mestres de São Paulo e um dos primeiros personagens que me ocorreu foi o Trisca. Ainda bem que o telefone da Vera Maria continuava o mesmo. Valeu Vera!
Agora, por um segundo, vamos considerar como é frágil a beleza do encontro. Trisca se aposentou naquele mesmo ano. Depois de 36 anos no orquidário. E aí trabalhou por mais 10 anos com orquídeas no projeto Pomar. Posso te passar o currículo dele e fotos de todos os seus certificados (centenas), mas não vou fazer nada disso. Você vai ter que acreditar em mim. Ninguém entende tanto de orquídeas quanto o Trisca. Ele ainda dá cursos e a ocasional consultoria para os verdadeiramente merecedores. Quando não está muito frio e o joelho permite.
O nome dele é Geraldo Neto. Trisca veio dos tempos da bola. Quando era zagueiro na Mooca e depois no time do Botânico. O apelido virou nome e o joelho virou dor. Trisca já foi falar de orquídea na Suiça, é amigo do Ronnie Von e do Lenine, continua morando na casa que era dos sogros e tem umas 200 orquídeas nos fundos, alguns gatos e Alemão, o cachorro.
Vai Lá
O Trisca dá aula sobre orquídeas no Móduio II do Curso de Jardinagem que a Graça, da Sinal Verde organiza no Instituto de Botânica do Jardim Botânico.
Mais informações:
Sinal Verde
Cursos Ambientais
Fone: (0xx11) – 5055-9321
e-mail: contato@sinalverde.com.br
Mestres de São Paulo - Jair Lustres Antigos
Jair é um homem de uma elegância rara. Assim como sua loja, que está de mudança da Rua Dr. Melo Alves para a Rua da Consolação. A loja é vítima da inexorável modernização da cidade de São Paulo, Jair não. Seus lustres não são afetados por modernismos, concretismos ou minimalismos. Ali o bronze, o latão e o cristal se unem em peças que, se não são eternas, parecem.
Antes de continuar nosso tour vou valorizar meu jornalismo investigativo um pouco. Este blog se alimenta da internet e principalmente de dicas. E a dica de fotografar o Jair veio de uma amiga que trabalha em um dos mais famosos escritórios de arquitetura de interiores de São Paulo. Quando ouvi fiquei logo interessado. Sou fotógrafo, penso imagens, imagino. E enquanto ouvia sobre Jair Lustres Antigos imaginava um lugar com uma atmosfera quase mágica, de centenas de mini-arco-íris projetados pelos cristais dos lustres flutuando na poeira típica dos antigos ateliers. Mas quem disse que o Jair estava a fim de ser fotografado? A Vânia, que trabalha com ele aparentemente desde que isso era ilegal pelo código da criança e do adolescente foi simpaticíssima ao telefone, entendeu na hora o projeto, coisa até então inédita. Me disse que ia falar com o Jair e que eu retornasse a ligação na semana seguinte, pois ele vinha de uma gripe brava. Terça-feira toquei a ligar para o Jair, que felizmente já estava melhor mas, mesmo tendo sido informado do projeto, ainda não se manifestara a respeito. Senti que ia ser difícil. Falei que voltaria a ligar dali a uma semana. Vânia se compungiu, sinceramente querendo me ajudar. Na outra terça, aproveitando que meus pais moram por perto, que lá o almoço geralmente é de primeira e ainda tem vaga para visitante, resolvi ir pessoalmente ao Jair depois do cafezinho, lá pelas duas.
Falei que o Jair é um sujeito elegante. Deixe-me ilustrar. Cheguei de surpresa na sua loja/atelier e sinceramente, na terceira terça-feira, esperava ter que lidar com alguém arredio à ideia de ser fotografado. Não que tenha sido recebido por um exibicionista, mas ele parou o que estava fazendo, me ofereceu assento em poltrona italiana de veludo e, quando percebi, já eram cinco da tarde. Falamos de arte, de cristais, do bairro, da cidade, do mundo. Atravessamos a rua e tomamos café no botequim do Alemão, onde falamos com o Alemão sobre botequins e superstições sertanejas (Alemão é de Pernambuco, eu acho). Não lembro de termos falado das fotos. Ao final, me levantando, deixamos marcado para a terça seguinte às três. Depois de sete dias tudo que eu imaginei quando ouvi sobre o lugar ficou pequeno. Tinha mais luz, mais cristais, mais bronze e muito mais gentileza. Só não tinha nenhuma poeira na loja, embora desse para ouvir as máquinas demolindo o resto do quarteirão do outro lado da parede.
Vai lá: Jair Lustres Antigos - Rua Dr. Melo Alves, 39 - tel: (11) 3082-8613
Mestres de São Paulo - Baltazar dos Relógios
Mestres de São Paulo - Baltazar dos Relógios
Read MoreMestres de São Paulo - Sapataria Busso
Acho que por me considerar um pouco artesão sempre fui fascinado por essas pessoas que passam a vida toda se dedicando a fazer uma coisa bem. A fazer o melhor. Acho que isso tem um pouco de religioso, lembra os monges budistas e suas mandalas.
Resolvi então ir atrás dos melhores artesãos de São Paulo e, logo que imaginei esse projeto, me lembrei da sapataria Busso. Quando praticava equitação, nas décadas de 1980 e 1990, ninguém sonhava com nikes e mizunos, os objetos de desejo dos cavaleiros e amazonas eram as botas do Busso. Nunca tive meu par, mas uma vez experimentei um no vestiário da Hípica e fiquei maravilhado. Aquilo sim eram botas! Fui lá ver se eles ainda faziam essas maravilhas.
Busso ainda é o nome do estabelecimento fundado em 1915, mas quem manda na casa desde que Gino Busso morreu é seu ex-discípulo, o Sr. Mario da Costa Carneiro, 84. Ele mesmo filho de sapateiro.
Além das botas, a Busso faz sapatos e botinas, tudo sob medida e em couro francês. Só usam couro francês. Quem deseja ter um par dessas maravilhas nos pés precisa ser paciente, mas não tão paciente assim. 20 dias é quanto demora. Primeiro são tiradas as medidas dos seu pés para a confecção de formas de madeira, que serão moldes dos seus pés para todo o sempre. Para sempre mesmo. Sr. Mario me conta, apontando para uma parede com prateleiras do chão ao teto forradas de pézinhos de madeira empoeirados: "Esses aí todos já morreram". Porque ele guarda os moldes desses pés do passado eu não perguntei. Fiquei pouco mais de uma hora com o Sr. Mario e o Sr. Walter, que no dia estava martelando e marcando couros marrons e pretos. O Walter está na casa só há 36 anos.
A divisão de trabalho no Busso é a seguinte: O Sr. Mario é o homem de frente, recebe, conversa, interpreta e analisa. Daí, com o pedido feito corta o couro e o Sr. Walter faz o resto.
A dupla é engraçada e cheia de histórias que eu prometi não publicar. A quantidade de absurdos que esses dois já escutaram da grãfinagem paulistana é infinita. Dava para ficar dias ouvindo e gargalhando com os causos. Pena que durou só uma hora.
Endereço: Rua Major Sertório, 452 - Vila Buarque - São Paulo - SP
Telefone: (11) 3256 9435
De segunda a sexta 08h - 17h30 / Sábado 08h - 12h / Domingo fechado